quinta-feira, 25 de março de 2010

Viagem versus Viajem

Esta é mais uma postagem de resposta a um comentário. Desta vez, foi o Tuninho Silva. Em primeiro lugar, quero agradecer pela observação. É mais um "gás" neste blog.

A dúvida do Tuninho foi a seguinte: qual a diferença entre "viagem" e "viajem"? Eu andei pesquisando, e em muitas gramáticas, tenho visto uma explicação bastante superficial. Apenas se diz: "viagem" (com g) se refere ao substantivo. Exemplo: Propus ao meu marido uma viagem ao Caribe. Já "viajem" refere-se ao verbo "viajar" conjugado na terceira pessoa do plural, no presente do subjuntivo. Exemplo: "Quero que eles viajem tranquilos".

Tal "explicação" não dirime a nossa dúvida: "cacildis", mas por que grafar um com "g" e o outro com "j"?  Vamos lá, é simples. Viagem é um substantivo terminado em "-agem". Salvo algumas raras exceções, substantivos terminados em "-agem" (vamos pensar no som) se escrevem com "g". Por exemplo: garagem, passagem, lavagem, bobagem etc. Vou citar uma exceção de que me lembrei: pajem.

Já o verbo "viajem" deriva de "viajar" (se "viajar" fosse escrito com "g", sabemos que teria outro som, não é? Por isso, obrigatoriamente se troca o "g" pelo "j". E é aí que começa a história). As formas flexionadas de um verbo regular devem seguir a grafia de seu infinitivo. Dessa forma, temos o radical "VIAJ", que é a parte inalterável do verbo viajar. Somando o radical VIAJ aos outros componentes – vogal temática, desinências número-pessoais e modo-temporais – temos a estrutura completa do verbo. Lembram-se das aulas de Estrutura das Palavras? Vamos tentar desfazer um pouco a imagem de "aula traumática" que essa matéria costuma ter nas nossas mentes de estudantes torturados pela Gramática de segundo grau. Tem gente que até chama de Dramática, haja vista o estrago que ela andou fazendo na sua vida.

Só pra ilustrar melhor, abaixo, coloquei a conjugação do verbo no presente do subjuntivo, com todas as pessoas, pra gente ter uma ideia global da questão.

eu VIAJe
tu VIAJes
ele VIAJe
nós VIAJemos
vós VIAJeis
eles VIAJem

Olha o VIAJEM com "j" aí, minha gente! Chora, cavaco... de novo. Não dá pra isolar "viajem" e sair comparando com "viagem". Por isso muita gente ainda tem dúvida, mesmo depois de ter estudado isso exaustivamente, por pelo menos uns 4 anos. Primeiro precisamos entender a estrutura de cada um. Depois, não vamos precisar comparar, porque nenhuma dúvida vai existir. É simples.

Pessoal, muita coisa parece difícil de entender (ou de explicar). Mas só parece. Quando a gente começa a conhecer, passa a curtir. O problema não está na Gramática. Está na forma como nos ensinaram no nível médio. Nem sempre era culpa do professor, e sim dos programas de aula prosaicos e mecânicos, que tinham qualquer objetivo, menos o de ensinar.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Resposta a um comentário ilustre


Esta postagem será uma resposta ao comentário que recebi ontem sobre a matéria "Hífen ou não". 

Adriano, obrigada pelo post. Eu estava até desistindo deste blog, mas seu comentário me incentivou a continuar postando. Errando ou acertando, aqui estou eu. E com esse novo acordo ortográfico, minha vida virou um verdadeiro inferno, pois minhas certezas começaram a cambalear (o que é normal no início). Mas é bom, pois assim voltamos ao hábito de estudar e saímos da zona de conforto. Já comprei tanta gramática e dicionário, desde que o acordo começou a dar sinais de realidade, que perdi a conta. E como vi divergência!

No dicionário Houaiss, que você usa como exemplo no seu post, já temos "micro-ondas" e "anti-inflamatório" com hífen porque em junho de 2009 já estava vigorando o novo acordo. E por mais que tenhamos tempo para adaptações a essa regra, todos os meios de comunicação já passaram a usá-la desde janeiro do mesmo ano. Poucos são os que não estão seguindo esse padrão. Mas ainda assim estão no seu direito. 
 
Com relação a "micro-organismo", consultei o dicionário do Bechara e vi as duas ocorrências: "micro-organismo" e "microrganismo" (forma variante). Só pra infernizar nossas vidinhas tão insignificantes (rs). E isso acontece com inúmeras palavras. Vou dar um exemplo (que nem é da turma do "com hífen ou não") que tirei do livro do Sacconi (Guia ortográfico e ortofônico): "relampear", cujas formas variantes, segundo ele, são: "relampejar, relampadejar, relampaguear, relampadar e relampar". É de arrepiar cabelinho do dedinho do pé (como diz minha avó). 

Agora, sobre não pronunciar "mi-cro-or-ga-nis-mo" exatamente como se escreve, pode acreditar que acontece com a grande maioria das palavras. Estamos pegando carona na "Lei do Menor Esforço" (uma das leis fonéticas, em que o falante simplifica a emissão dos sons, facilitando os órgãos do aparelho fonador). A gente não fala, por exemplo, "Con-de-de-Bon-fim" (o nome de uma rua da Tijuca). Falamos "Condibonfim" (mais ou menos isso). De fato, quase nunca falamos exatamente como escrevemos. Porque a fala se distingue da escrita (embora a escrita seja uma tentativa de registro da fala, e é isso que complica nossa vida na hora de escrever). Pra piorar, isso ainda varia de região pra região (não só no som como também no vocabulário e na estrutura frasal. É o que chamamos de variação diatópica). Embora essa variação não tenha relação direta com a tal lei fonética, é importante ressaltá-la aqui, porque ela também interfere na pronúncia (e muito). Só pra você ter uma ideia de como a nossa língua é rica. E como a nossa gramática "mete" medo.

Quanto ao símbolo de litro, eu concordo com você. Prefiro o símbolo com letra minúscula. Tenho pesquisado muito, e vejo que não há um consenso sobre o que será tendência (se "l" ou "L"). Eu trabalhei numa agência que fazia encartes para um supermercado, e os diretores de arte usavam uma fonte sem serifa, o que me obrigava a exigir o "L" em caixa alta, principalmente porque, por exigência do cliente, a medida deveria vir colada ao número correspondente, se este tivesse apenas um algarismo (é, o cliente tem sempre razão). Nesse caso, tínhamos que diferenciar, pra não gerar confusão, principalmente por se tratar de uma publicação que envolve questões legais. 

No site do Inmetro, símbolo não é abreviatura (portanto não tem ponto), não é expoente (portanto não se sobrescreve) e não tem plural. O que se diz em relação a letras minúsculas é na escrita do nome, já que temos símbolos escritos em maiúsculas (joule/J, coulomb/C, watt/W, por exemplo). Quanto ao litro, na tabela do Inmetro aparecem "l" e "L". Sendo assim, ambas as formas ainda são aceitas. 

Mas como você pediu minha opinião, digo que prefiro sempre usar em minúsculas, independente de a fonte ser serifada ou não. Sempre optarei por escrever assim, até o momento em que deixar de ser correto. 

Mais uma vez, obrigada pela força. Seu comentário me animou. E eu nem vejo como dúvida. Pra mim, foi uma colaboração grandiosa e uma opinião que merece todo o meu respeito.